"Viva o Brasil Unido!"
Carta original, datilografada e assinada por Santos=Dumont celebrando o Brasil Unido |
Por este motivo, talvez seja oportuno lembrarmos de Santos-Dumont. Em um momento especialmente conturbado de nossa História, dias após a eclosão da Revolução Constitucionalista de 1932, Santos-Dumont, desejando inteirar-se da situação política, solicitou uma audiência com o então governador do Estado de São Paulo, Pedro de Toledo. Ao sair da reunião, declara que vai escrever uma carta-manifesto. Na carta, publicada em 14 de julho de 1932, Santos-Dumont clama pelo respeito à Constituição e pelo fim do conflito entre irmãos. Ao final, prega a união de todos os brasileiros: "Viva o Brasil Unido!"
"São Paulo, 14 de julho de 1932. Meus patrícios,
Solicitado pelos meus conterrâneos moradores neste Estado para subscrever uma mensagem que reivindica a ordem constitucional do país, não me é dado, por moléstia, sair do refúgio a que forçadamente me acolhi, mas posso ainda por estas palavras escritas afirmar-lhes, não só o meu inteiro aplauso, como também o apelo de quem, tendo sempre visado a glória da sua pátria dentro do progresso harmônico da humanidade, julga poder dirigi-se em geral a todos os seus patrícios, como um crente sincero em que os problemas da ordem política e econômica que ora se debatem, somente dentro da lei magna poderão ser resolvidos, de forma a conduzir a nossa pátria à superior finalidade dos seus altos destinos.
Viva o Brasil Unido!
Santos=Dumont."
Exerça sua cidadania e vote com consciência.
Viva Santos-Dumont!
Viva a Democracia!
Viva o Brasil Unido!
Leia trecho do livro "Alberto Santos-Dumont, Novas Revelações”, de Cosme Degenar Drumond:
“Em 23 de maio de 1932, uma agitação popular assombrou a capital do estado. Populares saquearam uma loja de armas e atacaram a sede da Legião Revolucionária (que apoiava Vargas). Durante o tiroteio, quatro estudantes foram mortos: Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo. Suas iniciais, MMDC, tornou-se grito de guerra e, a despeito das articulações políticas para evitar o agravamento da situação, a conflagração rebentou após entendimentos entre paulistas, gaúchos e mineiros. As tropas de voluntários mobilizadas provinham de todas as classes sociais. O interventor de São Paulo desaconselhou a luta armada. Mas, ao ver seus esforços fracassarem, enviou telegrama a Vargas: 'Esgotados todos os meios que a meu alcance estiveram para evitar o movimento que acaba de se verificar na guarnição desta região, ao qual aderiu o povo paulista, não me foi possível caminhar ao revés dos sentimentos de meu Estado'. Pedro de Toledo renunciou ao cargo de interventor. Contudo, aclamado pela revolução que se formava, foi reconduzido ao poder.
Santos-Dumont quis se inteirar dos acontecimentos políticos e solicitou audiência a Pedro de Toledo. No Palácio dos Campos Elísios, foi recebido por um assessor do gabinete, Cândido Motta Filho (1897-1977), que desde criança admirava o inventor. Tanto que, em 1919, fizera um voo panorâmico, recorrendo ao aviador americano Orton Hoover, instrutor de voo da Força Pública Paulista. Duas décadas mais tarde, Motta Filho viria a ser ministro da Educação e Cultura no governo Café Filho (1954-1955). Ali, ao lado de seu ídolo, ficou tão radiante que registrou o momento em suas memórias, 'Contagem Regressiva'. Uma cópia dessa passagem se encontra no arquivo organizado pelo brigadeiro Lavenère-Wanderley:
- Que alegria, para mim, conhecê-lo pessoalmente! Para mim, o senhor é uma figura de romance...
Ao que Santos-Dumont respondeu: 'Se fiz alguma coisa é porque era novo e acreditava que para a mocidade nada é impossível'.
Motta Filho observou-o melhor:
O personagem de Júlio Verne andava ao meu lado. Seus cabelos lisos, de uma cor baça e amarelada, caíam-lhe na nuca, por cima do colarinho alto. Seus passos apressados não pareciam, entretanto, de um albatroz, mas de um parisiense daquela sociedade que vinha de Bourget, passava por Maupassant e caía na pena de Marcel Proust.
No salão do palácio, enquanto aguardava o governador, tinha a cabeça baixa, os olhos fixos no chão enladrilhado, ele que vivera com os olhos no céu.
Na audiência com o governador rebelado, foi informado da gravidade da situação. Ao sair da reunião, já preocupado com o iminente conflito, a caminho do carro, cruzou novamente com o admirador que o elogiara momentos antes e comentou: 'Estou com São Paulo com todas as consequências dos momentos difíceis. Vou dizer isso em público, em manifesto. Não sou político, mas compreendo as situações políticas'.
Em poucos dias, seu quadro emocional alterou-se. Examinado por uma junta médica, recebeu a orientação de buscar uma cidade litorânea para uns dias em repouso. Escolhida a praia de Guarujá, ao lado de Santos, para lá foi transportado de carro por Jorge Villares. Hospedou-se no Hotel de la Plage, quarto nº 152, enquanto o sobrinho ocupava o quarto ao lado. O aviador Edu Chaves, que morava em Santos, passou a visitá-lo quase diariamente.”
Nove dias depois de divulgar esta carta-manifesto e três dias após completar 59 anos, Alberto Santos-Dumont se suicidou, em 23 de julho de 1932, no Guarujá. A causa foi a depressão crônica, que o afligia há mais de uma década. Alguns biógrafos sustentam que o uso do avião como arma de guerra, durante a Revolução, teve influência em seu suicídio.
Seus restos mortais repousam junto aos de seus pais, Henrique e Francisca, no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro'.
Texto integral de um fã da página que prefere não se identificar.
A Revolução de 1932 e a Morte de Santos=Dumont
É muito difícil para quem escreve sobre a ‘Maravilhosa Vida de Santos=Dumont, falar sobre sua morte. Mas 15 anos depois do inicio do blog, a pedido de leitores, segue minha pesquisa sobre o assunto.
Gostaria de iniciar e terminar essa matéria com as lindas palavras de Henrique Dumont Villares, seu sobrinho:
QUEM DEU ASAS AO HOMEM - 1953
“...De São Paulo que, no pungente momento desse trespasse, se achava isolado do resto do mundo por força do movimento armado, assim mesmo partiu e reboou longe a inesperada, dilacerante notícia.
Foram universais as manifestações de pesar. Logo, em 25 de julho, o governo do Brasil decretava “luto nacional por três dias, pelo falecimento de Alberto Santos-Dumont”, salientando, nos seus “consideranda”, que “o brasileiro Alberto Santos-Dumont, inventor da direção dos balões e do vôo mecânico, dotando a humanidade de novos engenhos para o seu desenvolvimento, estreitou os laços entre as nações e cooperou para a paz e solidariedade entre os povos, tornando-se, assim, merecedor da gratidão do Brasil, cujo nome honrou e glorificou”.
Não era esse, aliás, apenas um luto nacional: mas universal. Era um gênio que o mundo todo perdia. Para sempre fechava suas asas quem deu asas ao homem.
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Podemos iniciar este relato com a triste noite de 9 de julho de 1932, Santos=Dumont acompanhava as notícias dos confrontos na Praça da República, entre integrantes da Legião Revolucionária Getulista, fundada por Miguel Costa, e pessoas contrárias ao que a Legião defendia.
Segundo o artigo de 24 de outubro de 1932, desde aquela época, a suspeita de suicídio estava em pauta. |
Nesse embate, onde foram usadas até armas de guerra, morreram os jovens paulistas Miragaia, Martins, Dráusio e Camargo, que dariam origem à sigla MMDC que reunia os conspiradores revolucionários, e também à um confronto armado sem precedentes na historia de São Paulo.
Era a Revolução Constitucionalista de 1932. O Estado de São Paulo liderava uma revolta contra Getúlio Vargas, que, a seu ver, havia assumido o poder de forma antidemocrática. A insatisfação aumentou devido à nomeação por Vargas de um interventor externo para São Paulo.
As elites paulistas liberais exigiam eleições e uma nova Constituição, mas isso não aconteceu.
Foi então que a aviação teve seu importante papel, o governo federal contava com cerca de 58 aeronaves entre a Marinha e o Exército, enquanto os paulistas tinham apenas dois aviões Potez e dois Waco, além de alguns aviões de turismo.
Um terceiro avião foi obtido pelos rebeldes com a deserção do tenente Artur Mota Lima, que trazia uma aeronave do Campo dos Afonsos, no Rio de Janeiro.
Os "vermelhinhos", como eram chamados os aviões do governo federal, eram usados em combate para bombardear cidades paulistas, inclusive Campinas, e também para propaganda, lançando panfletos sobre cidades inimigas e locais de concentração de tropas rebeldes.
Aeronaves das Unidades Aéreas Constitucionalistas (UAC), apelidadas de “gaviões de penacho”, tiveram participação limitada.
Durante a Revolução de 1932, apesar das limitações das aeronaves, a aviação realizou duas façanhas notáveis: em 21 de setembro, atacou Moji-Mirim e inutilizou cinco dos sete aviões federais antes que pudessem decolar; e em 24 de setembro, três "Gaviãos de Penacho" atacaram o couraçado Rio Grande do Sul em Santos para relaxar o bloqueio do porto.
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Nossa história se passa meses antes, no dia 23 de julho, quando Santos=Dumont é brutalmente atormentado pelos voos da guerra.
A preocupação com o uso de aeronaves em guerra não era recente, seis anos antes, em 1926, Santos=Dumont já havia enviado uma carta à Liga das Nações pedindo a proibição do uso de aviões como arma de guerra, chegando até a oferecer uma quantia em dinheiro para quem escrevesse uma monografia sobre o assunto.
Sua solicitação foi ignorada.
Mediante tanta dor, a morte do inventor ocorreu no Hotel La Plage, quando seu repouso de convalesceça por um 'distúrbio nervoso' foi abruptamente interrompido pelo barulho de aviões indo para seu destino de guerra - a dor tornou-se insuportável.
A versão da síncope cardíaca
Mesmo perplexa com os atentados à São Paulo, a opinião pública tentava entender o que de fato teria acontecido com Dumont, a versão oficial, contada pela imprensa, era que Dumont havia morrido de clapso cardiáco.
Esse é o trecho do laudo necrológico do legista Roberto Catunda:
“Guarujá – Alberto Santos Dumont – 23-julho-1932. Alberto Santos Dumont – Brasileiro, branco, solteiro, com 59 anos de idade, inventor. Ao que consta, foi encontrado morto em um dos apartamentos do hotel de La Plage, no Guarujá, onde residia. Trata-se do cadáver de um homem de estatura mediana e de constituição regular, ainda em estado de flacidez muscular. Veste terno de casimira preta, gravata preta e calça botinas pretas. Não encontramos pelo corpo vestígio de lesão traumática. A morte se deu por colapso cardíaco”.
Como sabemos, por conta da revolução de 32, S=D não pode ter seu velório e enterro no momento de sua morte, foi então que o professor da Faculdade de Medicina de São Paulo, Walter Haberfeld preparou o corpo de S=D para mantê-lo íntegro até o efetivo funeral, no dia 22 de dezembro de 1932, no túmulo que mandou construir no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro.
Parte desse processo de embalsamamento, foi a retirada de todos os órgãos internos. Walter descartou todos os outros órgãos más manteve o coração preservado, “eu queria transformar o coração conservado numa representação física de Dumont em seu plano carnal”. Haberfeld manteve o coração de Dumont secretamente guardado em formol, por 12 anos, muitos crêem que ele queria guardar o coração de Dumont como forma de, num futuro próximo, revelar a verdadeira causa mortes de Dumont.
O Destino desse órgão ficou desconhecido até o ano de 1944 quando Paulo Gomide, voltou a apresentá-lo.
Era a Semana da Asa, no ano de 1944, o coração foi levado ao Rio de Janeiro em um voo, sendo entregue ao então Ministro da Aeronáutica, Joaquim Pedro Salgado Filho, pelo presidente da Panair, Paulo Sampaio.
Suspeitas de Enforcamento
Um capítulo significativo na história da aviação e da humanidade chegava ao fim, enquanto o mundo chorava sua partida, os acontecimentos que se seguiram revelaram a complexidade das emoções e reações humanas diante de uma perda tão importante, em um momento tão obscuro da a história do Brasil.
O triste acontecimento do quarto 151 repercutiria em uma série de acontecimentos. Jorge Dumont Villares, que se hospedava no quarto 152, ao lado do tio e mentor, viu-se naquele momento com um grande desafio.
A solidariedade humana surge como um raio de luz em meio à escuridão, amigos, familiares e admiradores se uniram para homenagear Santos=Dumont e oferecer conforto, porém, nem todas as reações foram permeadas de respeito e empatia.
Luxuoso Grand Hotel La Plage, no Guarujá e algumas últimas fotos do Santos=Dumont no local, antes da tragédia do quarto 151 |
Alguns funcionários do hotel, repórteres e pessoas que estavam presentes no momento, em um gesto cruel e insensível, fizeram comentários desrespeitosos e mórbidos sobre os eventos ocorridos no quarto 151. Suas ações demonstram uma falta de compreensão da profundidade do luto e da importância histórica. E isso gerou uma serie de boatos e desinformações que persistem até os dias de hoje.
Mas foi somente em 1º de novembro de 1972 que a verdadeira história foi revelada, em uma reportágem histórica de Edmar Morel, autor de 'O Pai da Aviação', intitulada “Santos=Dumont, O Gênio Torturado”, faz um apanhado das conquistas e glórias do inventor, bem como aparece com um surpreendente relato do delegado Raimundo de Menezes, enviado de Santos ao Guarujá no dia de sua morte:
“Uma noite, recebi a informação vinda de Guarujá de que o grande inventor fora encontrado morto no banheiro. Organizei a caravana e para lá seguimos. No “Hotel La Plage”, o mais elegante daquela praia, tivemos que arrombar a porta do banheiro, por cuja clarabóia se avistava o corpo pendurado numa gravata ou num cordão de roupão. Magríssimo, era ele um feixe de ossos.
Persuadido de que era o culpado pela invenção do avião, que estava servindo para bombardear os seus patrícios, disse por várias vezes a Edu Chaves, com quem se encontrava alojado no hotel, que se sentia angustiado por isso.
Aproveitando um instante de descuido realizou o seu intento: enforcou-se. Comuniquei imediatamente ao chefe de Polícia, Dr. Tirso Martins, o ocorrido, bem como o pedido da família para que lhe fosse entregue o corpo, sem maiores formalidades legais.
Autorizado, assim procedi, tendo por isso os jornais do dia seguinte anunciado o episódio como morte natural, havendo o médico legista dr. Roberto Catunda dado o atestado assim afirmando. Não houve inquérito policial.
Tratava-se de uma glória nacional. Daí a ordem da Secretaria de Segurança, a pedido da família.
Eis o que sei a respeito.”
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Mesmo com o chocante relato do delegado, que presenciou a morte e acabou com o mistério e as más palavras dos crueis, ainda hoje a morte de Santos=Dumont é cercada de polêmicas.
Sophia Helena, parente próxima do aviador, tinha muita dificuldade em abordar esse tema, ela dizia algo como "parece que ele se matou" ou "dizem que ele se matou" no documentário de Nelson Hoineff, roteiro de Henrique (no versão que tem 10 minutos a mais), como se não quisesse acreditar.”
E no fim deste duro, porêm importante artigo, como ela havia dito no início, termino com a frase de outro parente, Henrique Dumont Villares:
“E então, em 23 de julho de 1932, seus olhos, que tantas vezes viram o que ainda não vimos, fecharam-se para sempre.”
Há uma fala de Leonardo Da Vince, que considero uma oração e ilustra muito bem a vida e a morte de Santos=Dumont:
“Siccome una giornata bene spesa dà lieto dormie, così una vita bene usata dà lieto morire”.
Assim como um dia bem passado traz um sono feliz, uma vida bem vivida traz uma morte feliz.
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